HOMILIA DE DOM DULCÊNIO FONTES DE MATOS NA MISSA CRISMAL 2015
(Catedral Diocesana de
Palmeira dos Índios- AL, 02 de abril de 2015)
Nesta liturgia em que celebramos, reunimo-nos para
a consagração do Santo Crisma e a bênção dos Óleos dos Catecúmenos e dos
Enfermos. Porém, o Bispo com o seu presbitério se reúnem para rememorar a
instituição do Sacramento da Ordem feita por Nosso Senhor Jesus Cristo,
manifestando claramente a unidade do sacerdócio e do sacrifício de Cristo
continuado na Igreja, no vislumbre da comunhão dos presbíteros com o seu Bispo.
Com a comemoração do quinquagésimo aniversário do
Decreto Presbyterorum Ordinis, do Concílio Vaticano II, acerca do
ministério e vida dos presbíteros, desejo ardentemente refletir hoje acerca de
um aspecto presente neste importante e atualizado documento que diz respeito à
nossa vida de sacerdotes em relação com o mundo e a sociedade hodiernos no afã
de injetar ânimo para a nossa vida de consagrados a Cristo, indivisamente, para
levar adiante a missão salvadora da Igreja (e, por isso, também de Cristo) com
a nossa paternidade e zelo de pastores de almas.
Escutei em certa ocasião de um experiente sacerdote
a seguinte sentença: “Nunca foi tão difícil ser padre como nos dias de hoje”.
No alto dos meus quase trinta anos de vida sacerdotal, constatei que esta
afirmação não se trata de um exagero, mas de uma realidade subliminar,
quasemente oculta, entretanto verdadeira. O mundo e a sociedade com as suas
propostas perigosamente permissivas visam minar a integridade da vida dos
nossos consagrados. Com suas falsas benesses, com uma acerbada práxis
consumista e hedonista, quem leva a bom termo a vivência de sua consagração
sacerdotal, das suas promessas juradas desde a Ordenação Diaconal e
Presbiteral, aparenta ser estranho ao presente, no entanto, sucede com atenção
àquilo que Nosso Senhor Jesus Cristo, o Vero Sacerdote e Bom Pastor, almeja
para que assim o façamos.
Humanamente, o ser Sacerdote é um desafio sem
medidas; e, porque não dizer: uma violência tremenda e constante para a nossa
sensibilidade humana tendenciosa ao pecado. Não deixamos de ser homens. Não!
Mas, sublimando a nossa humanidade, num processo de nossa parte que exige
ascese, luta, determinação, a Graça opera em nós, auxiliando-nos. E este agir
da Graça em nós propicia-nos a ser transmissores das realidades do Alto, desta
mesma Graça Divina que deseja ser comunicada a todos os homens, levando-os à Salvação.
O Concílio Vaticano II, no Presbyterorum Ordinis,
atenta-nos sobre esta realidade já acenada por Jesus em sua Oração Sacerdotal: “Dei-lhes
a tua palavra, mas o mundo os odeia, porque eles não são do mundo, como também
eu não sou do mundo” (Jo 17,14). Afirma-nos o Vaticano II: [Os presbíteros] “Não poderiam ser ministros de Cristo se não fossem testemunhas e
dispensadores duma vida diferente da terrena, e nem poderiam servir os homens
se permanecessem alheios à sua vida e às suas situações. O seu próprio
ministério exige, por um título especial, que não se conformem a este mundo;
mas exige também que vivam neste mundo entre os homens e, como bons pastores,
conheçam as suas ovelhas e procurem trazer aquelas que não pertencem a este
redil, para que também elas ouçam a voz de Cristo e haja um só rebanho e um só
pastor” (PO 3).
Principalmente com o Concílio de Trento, a fórmula “ex opere operato” é escutada e digna de
fé. A atitude sacerdotal (especialmente no tocante à validade dos sacramentos)
não deveria independer nunca da santidade pessoal do sacerdote. Deveremos ter
bastante cuidado em não cair naquela advertência de reprovação feita por Jesus
aos escribas e fariseus – “Observai e fazei tudo o que eles dizem, mas não
façais como eles, pois dizem e não fazem” (Mt 23,3) –, pois às nossas palavras
sejam acompanhadas pelos nossos atos, por nossa vida exterior e,
essencialmente, interior.
No tríplice múnus do ministério sacerdotal, assumido em união e
cooperação com o Bispo, nunca devemos perder de vista toda a carga teológica e,
portanto, espiritual, existente no agir in
persona Christi Capitis – no agir na pessoa de Cristo Cabeça. A Carta aos
Hebreus (7,26) traz quatro predicativos necessários aos sacerdotes graças à sua
configuração a Cristo Sacerdote. É certo que eminentemente esses adjetivos são
típicos do próprio Senhor, no entanto, num esforço constante, deveremos imitá-lo
com mais acuidade. Cristo é Pontífice “santo, inocente, impoluto, separado dos
pecadores”. Agindo em Sua Pessoa, em Seu Nome, também deveremos sê-lo, o que
nos exige a santidade pessoal. Daí o Presbyterorum Ordinis
conter: “os presbíteros, consagrados pela unção do Espírito Santo e enviados
por Cristo, mortificam em si mesmos as obras da carne e dedicam-se totalmente
ao serviço dos homens, e assim, pela santidade de que foram enriquecidos em
Cristo, podem caminhar até ao estado de varão perfeito. […] Por sua vez, a
santidade dos presbíteros muito concorre para o desempenho frutuoso do seu
ministério; ainda que a graça de Deus possa realizar a obra da salvação por
ministros indignos, todavia, por lei ordinária, prefere Deus manifestar as suas
maravilhas por meio daqueles que, dóceis ao impulso e direção do Espírito
Santo, pela sua íntima união com Cristo e santidade de vida, podem dizer com o
Apóstolo: ‘se vivo, já não sou eu, é Cristo que vive em mim’ (Gl 2,20)” (PO
12).
Para nós sacerdotes, a nossa santidade
pessoal não é uma opção, mas uma obrigação, uma sensatez para o nosso múnus de
ensino e santificação; poderá ser, inclusive, uma autorização mais convincente
no nosso múnus de governo do Povo de Deus. Deveremos sempre lustrar a Graça
recebida no dia de nossa Ordenação, ainda que já tenhamos uma longa trajetória
presbiteral. Pela santidade de vida, renovamos, quotidianamente, o nosso ‘sim’
a Deus, a nossa entrega sem reservas.
A santidade terá como influências
algumas atitudes que nos favorecerão a alcançá-la. E o interessante é que a
Igreja, quando das nossas promessas sacerdotais, já nos prevenira da eficácia
dessas práticas ligadas ao nosso ministério. Assim sendo, os presbíteros
alcançarão a santidade exercendo as suas tarefas no espírito de Cristo: “Queres
unir-te cada vez mais ao Cristo, sumo Sacerdote, que se entregou ao Pai por
nós, e ser com ele consagrado a Deus para a salvação da humanidade?” Como
ministros da Palavra de Deus pela escuta, meditação e ensino, aperfeiçoam-se na
vida cotidiana, bem como a seus fiéis e ouvintes de suas pregações. Somente
transmitirei com veemência o que amo e trago no coração: “Queres, com dignidade
e sabedoria, desempenhar o ministério da palavra, proclamando o Evangelho e
ensinando a fé católica?”. Como ministros da Liturgia, são convidados a
imitarem o que fazem e o que são: representar a pessoa de Cristo Redentor:
“Queres celebrar com devoção e fidelidade os mistério de Cristo sobretudo pelo
Sacrifício eucarístico e o sacramento da Reconciliação, para louvor de Deus e
santificação do povo cristão, segundo a tradição da Igreja?”; “Recebe a
oferenda do povo para apresentá-la a Deus. Toma consciência do que vais fazer e
põe em prática o que vais celebrar, conformando tua vida ao mistério da cruz do
Senhor”. Daí a importância de cultivarem o costume da celebração diária da
Santa Missa, ainda que sem a presença física do Povo de Deus, fazendo do Santo
Sacrifício Eucarístico o ápice de sua vida consagrada. Pela oração, estejam
sempre unidos a Deus; cultivem a ascese, aprontando-se para os diversos
sacrifícios e as inúmeras batalhas que vida nos impõe, estando sempre
disponíveis aos caminhos – mesmo novos – que o Espírito sugerir. Neste espírito
de oração nunca esquecer-se da frequência ao Sacramento da Confissão e da fidelidade
necessária ao Ofício Divino, emprestando a sua voz à Igreja, que persevera na
oração em nome de todo o gênero humano e em união com Cristo: “Queres implorar
conosco a misericórdia de Deus em favor do povo a ti confiado, sendo fielmente
assíduo ao dever da oração?”. Em síntese: sermos homens da Palavra, da
Eucaristia e da Oração nos permitirá esta maior configuração à santidade de
Cristo Sacerdote.
“Sede sóbrios e vigiai. Vosso
adversário, o demônio, anda ao redor de vós como o leão que ruge, buscando a
quem devorar: resisti-lhe: sede fortes na fé”. (1Pd 5,8-9a). O diabo quer nos
fisgar pelas situações e vicissitudes do mundo atual. Sabe que somos graves
ameaças ao seu projeto demoníaco, que, de per
si, é falido. Suas investidas aparentam-se nas ondas e modismos do
modernismo, do mundo. Sejamos santos; ilibados na conduta; sejamos atentos!
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