A IGREJA CAMINHA COM OS LEIGOS

A caminhada da Igreja, nos seus mais de dois mil anos de percurso, tem sido envolvida na dialética da morte e ressurreição do Jesus Cristo, e, a partir do Senhor, esta dialética invade a vida dos fiéis cristãos que encaram, à luz do seu Batismo, as variadas dificuldades de suas vidas. As inúmeras perseguições sofridas pela Igreja, leva os cristãos a reafirmarem suas opções, a aprofundarem sua fé e os convida a uma atitude humilde e vigilante, atendendo ao conselho de São Paulo: “quem está de pé, fique atento para não cair (1Cor. 10,12). É um apelo para confiar menos em si e mais na Graça divina, para colocar-se disponível ao Espírito Santo, que o fará descobrir a sua vontade. “Manifestastes estas coisas aos pequenos e as ocultastes aos sábios e entendidos” (Mt. 11,26).
Humildade, pequenez... Se não nos tornarmos pequenos, não poderemos compreender as coisas de Deus. Não que tenhamos que entender a totalidade do ilimitado plano divino, como se o exauríssemos num dissecar de Seu imperscrutável pensamento. Não. Mas, na atitude ativo-passiva de colocar-se à disposição de Sua vontade de maneira livre e consciente: "Seja feita a tua vontade" (cf. Mt. 6,10). Quando damos mais valor aos nossos títulos, prestígio, dignidade, quando nos fechamos no egoísmo, então as coisas de Deus nos escapam e não entendemos mais o caminho da Igreja.
Com as palavras acima, dirijo-me, de modo particular, aos leigos e leigas. A Exortação Apostólica do Papa João Paulo II CristifidelesLaici, que tem como tema a Missão dos Leigos na Igreja e no Mundo, fala, na sua introdução, do capítulo 20, versículo 20-21, do evangelho de Mateus: “O Reino dos céus é semelhante a um proprietário, que saiu muito cedo a contratar trabalhadores para sua vinha. Ajustou com eles um denário por dia e mandou-os para vinha”. Essa parábola nos faz refletir e nos abre os olhos à imensa vinha do Senhor e a grande quantidade de operários que ele chama e envia para o trabalho.
A vinha é o mundo inteiro (cf. Mt 13,8), que deve ser transformado segundo a vontade de Deus. O envio “ide vós também para minha vinha” (Mt 20,3-4) é universal, o que atinge a todos os batizados. Esse chamado não diz respeito só aos pastores, religiosos e religiosas, mas estende-se a todos os leigos e leigas que são chamados de forma pessoal por Deus e recebem uma missão para atuar na Igreja e no mundo.
Diante do chamado individual do Senhor, é hora de abrirmos bem os nossos olhos não somente à fé, mas, a partir desta, igualmente às violências a que hoje é submetida à pessoa humana, e lutarmos. Isto é algo pertinente à nossa missão batismal; também aí o Senhor nos espera. Somos chamados a mudar tal realidade, a nos empenharmos para que os direitos fundamentais da pessoa humana, alicerçados inclusive pela Constituição Federal, sejam cumpridos, como por exemplo, o direito à vida, à integridade, à casa e ao trabalho, o direito à família e à procriação responsável, o direito de participar da vida pública, o direito à liberdade de consciência e de profissão de fé religiosa.
Tornar-se protagonista de uma nova cultura humanista é uma exigência ao mesmo tempo universal e pessoal. Agradeço aos leigos e leigas da nossa Diocese de Palmeira dos Índios que vêm exercendo seu papel diante de uma sociedade sofrida e, por vezes, excluída pela lógica da descartabilidade, fruto de um sistema capitalista selvagem; dos que, em nome de Cristo, atuam de maneira responsável e digna pela  luta em favor do bem comum. Através de atos concretos diante das situações adversas, os leigos se solidarizam com os irmãos e as irmãs, ainda que se lhes custem a própria vida.
Mas, qual o porquê desta valentia? O amor a Jesus Cristo. Eis o único motivo válido e verdadeiro para tanto: amar o Senhor, o que não dispensa o cuidado com os irmãos. Se esta atuação não for por amor a Ele, viveremos um filantropismo, uma alteridade, mas não o Evangelho, e o nosso espírito estará desprovido de Deus.
São Gregório Magno, ao pregar, comentava assim a parábola dos trabalhadores da vinha: “considerai o vosso modo de viver, caríssimos irmãos, e vede se já sois trabalhadores do Senhor. Cada qual avalie o que faz e veja se trabalha na vinha do Senhor.”
(Dom Dulcênio Fontes de Matos - Bispo de Palmeira dos Índios)

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