MENSAGEM PARA A ABERTURA DA CF 2013
Queridos diocesanos,
A partir de mais uma Quaresma, a Igreja no Brasil inaugura a
Campanha da Fraternidade, em sua 39ª edição. Neste ano, a CF terá como temática
‘Fraternidade e Juventude’ e como lema o trecho que fala da resposta do profeta
Isaías ao Senhor: “Eis-me aqui, envia-me” (Is 6,8), fazendo uma alusão entre a
vocação profética de Isaías e o imperativo que os nossos jovens possuem de
serem também profetas de Deus, porta-vozes do Senhor no mundo que aí está.
Falávamos
que a Campanha da Fraternidade inicia-se a partir do tempo quaresmal para
deixar claro que ela não para aí, mas deve perdurar no coração e na vida dos
fiéis cristãos por longas datas. Tampouco, a sua vivência e as preocupações
surgidas pelas problemáticas abordadas devam ter a validade de um ano, todavia
seja um despertar – dentre tantas celeumas já denunciadas ou que ainda estão
por vir – da sociedade.
A
CF 2013 surge não somente para apontar as dificuldades enfrentadas pelos jovens
ou relacionadas a eles, tais como os desafios que se lhes avizinham, antes “se
propõe olhar a realidade dos jovens, acolhendo-os com a riqueza de suas
diversidades, propostas e potencialidades” (Texto-base da CF 2013, 1). Como
todos sabem, também neste ano de 2013, o Brasil sediará a Jornada Mundial da
Juventude. Este será o maior evento já realizado em nosso país, com dimensões
gigantescas, muito maiores do que a Copa do Mundo (2014) e as Olimpíadas (2016)
que igualmente haverão de ser realizadas aqui. Muito embora a imprensa não dê
muita cobertura à Jornada, a maioria de nossa juventude espera por esta
ocasião, pois aí se tratará de assuntos realmente pertinentes ao como ser jovem
na atualidade, não com as fantasias e garbos da Copa e das Olimpíadas, mas com
o ardor da fé em Cristo, vasculhar a realidade e saber que a jovialidade é uma
faixa etária ímpar para serem firmados na pessoa os valores universais para a
construção de uma sociedade mais fraterna, justa, detentora da gama de ações e
sentimentos provenientes da ética e da moral, que, por suas vezes, também são
apregoadas pelo cristianismo. Ser jovem, portanto, é viver a idade da
sedimentação do ser homem. Não enquanto gênero, mas, principalmente, no que
tange à hombridade.
O
homem só é mais homem se, de fato, é um ser integrado consigo, com os que estão
à sua volta, seus semelhantes, mas também com Deus. O Texto-base, logo em sua
primeira parte, trata dos impactos da mudança de época que estamos enfrentando,
cujas consequências são mais sentidas pelos nossos jovens. Afirmamos isto
porque a idade da maturação que ruma ao tornar-se adulto é a da mocidade. A
cultura atual nem sempre é um campo fértil para a formação do jovem, este mesmo
aspecto cultural que, não raras vezes, prescinde de Deus, sendo-lhe indiferente.
Desta forma, a Igreja torna-se apenas um lugar a mais para o jovem e não o
lugar fundamental para a construção do seu ser adulto. A nossa pregação de
pastores não é mais ouvida com presteza, mas ressoa como mais uma no turbilhão
de vozes oferecidas pela ‘garganta’ do mundo, chegando a ser encarada como
‘careta, retrógrada, fora de moda’. Caem os valores tradicionais, guardados
pelo Evangelho por nós anunciado. Ou se não chegam a cair, tornam-se
paradigmáticos em contraste com os contra-valores que o mundo brada. Se os
especialistas não falam mais de ‘época de mudanças’, discursam, averiguando a
iminência de ‘mudança de época’. Já com este panorama, nós, Bispos, colocamos
como objetivo geral desta CF: “Acolher os jovens no contexto de mudança de
época, propiciando caminhos para seu protagonismo no seguimento de Jesus
Cristo, na vivência eclesial e na construção de uma sociedade fraterna
fundamentada na cultura da vida, da justiça e da paz” (Texto-base da CF 2013,
4). Logo, se o jovem encara, levado pela ‘onda do momento’, a Igreja como mais
um lugar dentre tantos aparentemente mais sedutores e aprazíveis, devemos
dar-lhe o que temos de melhor: Jesus Cristo. E, enraizando o seu coração no
Cristo, que também é jovem, deverá apaixonar-se por Ele, fazendo-se discípulo-missionário
a partir desta mesma Igreja, na construção de um mundo melhor e mais humano.
Por conta disto, a Igreja sente um imenso desafio: como comunicar-se com os
jovens? Como atraí-los sem negar a sua essência de guardiã da Verdade, que é
invariável, porque é Jesus Cristo mesmo? Então, o Espírito de Deus
responde-nos: A busca de modelos pelos jovens é uma porta que se abre para lhes
apresentarmos a pessoa de Jesus Cristo. Nesse sentido, um importante desafio da
evangelização junto aos jovens consiste em ajudá-los a escutar a voz de Cristo
em meio em meio a tantas outras vozes. Se os jovens caracterizam-se pela busca,
ofereçamos-lhes Jesus como modelo jovial de vida. Eles O encontrarão e
perceberão o entusiasmo do seguimento e da imitação do Senhor. Este
protagonismo é garantia de que o Reino se renova graças ao Espírito Santo que
suscita pessoas sensíveis e generosas para o serviço a Deus e aos homens, tal
como empreende a Igreja, Mãe e Mestra do serviço.
Infelizmente,
é muito difundido em nossa juventude um pensamento de crise de sentido de vida,
graças a lacunas no ato de busca de identidade típico dos jovens. Esta falta de
sentido para as coisas, inclusive com a própria existência, e, desta, para com
a vida do outro, do próximo, gera a insensibilidade. A mania do descartável,
produto da tecnologia cada vez mais avançada, invade relacionamentos, despeja
na depressão, esvazia os sentimentos porque exaure o homem, a humanidade como
um todo. Nunca estivemos tão ‘conectados’ com o outro, porém, concomitantemente,
nunca estivemos tão distantes e alheios ao existir de alguém. Redes sociais que
sociabilizam o fútil (e não é redundância!), enquanto que o útil passa
despercebido. Não que a comunicação prática e imediata seja um mal. Longe
disso! No entanto, enquanto nos comunicamos em redes, tendemos a ser mais
distantes do sentir o outro: amigos ‘on
line’ aos milhares; qualidade do relacionamento, uma incógnita reticente.
E, se me importuna, basta um clique e ‘bye’.
E olhe que estamos apenas no mundo virtual. Se passarmos para o mundo real,
este descompromisso com o outro é abismal. O Santo Padre, Bento XVI, desafiando
os cristãos para a inserção do Evangelho em ‘novos areópagos’, defende que
utilizemos dos meios mais avançados de comunicação, atualmente a internet, com
tudo o que ela comporta (sites, e-mail’s, blogues, Facebook, Skype, Orkut...):
“Convido os cristãos a unirem-se confiadamente e com criatividade consciente e
responsável na rede de relações que a era digital tornou possível; e não
simplesmente para satisfazer o desejo de estar presente, mas porque esta rede
tornou-se parte integrante da vida humana. A web contribui para o
desenvolvimento de formas novas e mais complexas de consciência intelectual e
espiritual, de certeza compartilhada. Somos chamados a anunciar, neste campo
também, a nossa fé: que Cristo é Deus, o Salvador do homem e da história,
Aquele em quem todas as coisas alcançam a sua perfeição” (XLV Dia Mundial das
Comunicações Sociais – 5 de junho de 2011).
Este
niilismo relacional que assalta parte da juventude já se reflete nas famílias e
vice-versa. O isolamento que cristaliza as pessoas foi um marcante nos fins do
século XX e permanece sendo no momento atual. Naquilo que a Igreja denomina
‘igreja doméstica’, ou seja, na família, o diálogo em tantas horas, passa por
longe. E os fatores para que isto ocorra são diversos: desde pais que possuem
uma carga de trabalho com longas horas de duração, até mesmo elementos outros
que, paulatinamente, se inseriram no cotidiano dos lares, sendo aparentemente
‘imprescindíveis’ a sua existência no seu seio: a TV, o computador basicamente.
Estes eletros blindam a convivência, paralisando-a, tornando casa sinonímia de
ajuntamento de pessoas unidas apenas pela consanguinidade e pela genética, em
detrimento do diálogo e da partilha. Os familiares (e aí estão os jovens)
passam por desconhecidos. Os pais e as escolas não são os únicos instrutores
dos jovens, a ‘net’ e o visualizado na TV, inclusive o estilo de vida propagado
por ela, mexem com a educação deles. Os pais não somente instruem os filhos,
como, em se tratando de novas tecnologias, os pais se tornam aprendizes, por
necessidade e conveniência. A metodologia educacional urge em novos parâmetros
também escolares, graças ao conhecimento interativo e virtual. A escola não é o
único lugar do saber sistematizado, pois os cursos à distância ganham cada vez
mais campo e a atenção de nossos jovens.
Por
incrível que nos pareça, ainda herdeira da juventude dos anos 60, 70 e 80,
alguns de nossos jovens tendem a organizar-se em ‘tribos’ de diversas
naturezas. Este fator atesta a pluralidade existe entre a juventude, que não
vai mais de encontro às grandes estruturas de poder, mas associam-se em
pequenos grupos, diferenciados em conchaves sociais, econômicos, midiáticos,
religiosos e culturais. Encontramos alguns destes grupos que lutam por causas
diminutas, como igualmente encontramos outros que não possuem nenhuma bandeira
própria, mas que se unem por convenção. Associações desportivas, ecológicas,
culturais, artísticas, assistenciais, trabalhistas, corporativistas,
estudantis, partidárias, de afirmação de identidade (negros, índios, portadores
de deficiência, etc.), de redes sociais, dos que se portam frente à
globalização, religiosas... agrupamentos para todos os estilos de jovens e suas
mentalidades. Cabe às pessoas de Igreja (bispos, presbíteros, religiosos, fieis
leigos em geral) que saibamos, cada vez melhor, acolher os jovens que já estão
conosco e não somente os adventícios, os recém-convertidos. Na comunidade
eclesial, graças a Deus, existe uma significativa presença de jovens engajados
em diversas pastorais, movimentos e ministérios (liturgia, canto, catequistas,
coroinhas), como também, é notória a frequência dos jovens no seio eclesial
apenas para as celebrações dominicais, sem compromisso direto com a caminhada
pastoral da Igreja. A estes devemos acolher com distinção e delicadeza,
valorizando-os.
Com
estas nossas palavras, também alertamos para dificuldades outras que visam
encarcerar os nossos jovens em malhas perigosíssimas. Aqui, denunciamos o
tráfico e consumo de drogas que têm a juventude como principal vítima; o mundo
dos vícios: jogos, álcool, erotismos, dentre outros; a desigualdade e a falta
de oportunidade de vida no mercado de trabalho e, dependendo da classe social a
que pertença, em certos graus de escolaridade e de formação, inclusive o
seguimento em certas carreiras universitárias, reservadas basicamente para
aqueles que possuem um melhor patamar financeiro; o consumismo e as leis de um comércio
selvagem e excludente; a violência como um todo; enfim, denunciamos, repudiamos
e exorcizamos tantas mazelas que querem ou mesmo se abatem sobre os nossos
jovens.
Por
fim, recorremos aos valorosos exemplos oferecidos pela Bíblia Sagrada e pela
História da Igreja de jovens que se colocaram à disposição de Deus, como
instrumentos, para que fizesse a Sua obra. Já no Antigo Testamento, temos
Rebeca (cf. Gn 24), José do Egito (cf. Gn 39,7-20; 41,1-57), Samuel (cf. 1Sm
3,20), o Rei Davi (cf. 1Sm 16,1-13; 17), seu filho, o Rei Salomão (cf. 1Rs
3,4-28), os sete irmãos macabeus (cf. 2Mc 7,1-42), a Rainha Ester (cf. Est 2,7;
8-9), os profetas Daniel (cf. Dn 13,45-61), Ezequiel (cf. Ez 16,1-63), Isaías,
o mesmo que oferece a esta Campanha da Fraternidade o seu lema vocacional (cf.
Is 6). O Novo Testamento, a iniciar pelo próprio Jesus Cristo, oferece
testemunhos de jovens que estiveram em sintonia com Deus, com o seu Reino: a
Virgem Maria (cf. Lc 1,26-38; Jo 25-27), João, o Discípulo de Amado (cf. Jo
13,23; 19,25-27), o jovem Marcos (cf. At 12,12), São Paulo (cf. At 7,58; 9,1-9)
e tantos outros. Impulsionados pelo Evangelho, contagiados pela alegria que daí
emana, tantos jovens souberam ser, ao longo do bimilenar cristianismo,
testemunhas autênticas para a nova evangelização: homens e mulheres, jovens,
que tiveram suas vidas radicalmente transformadas pelo encontro com Jesus e não
pararam em si mesmos, mas comunicaram as suas experiências aos outros. Eis,
pois, os santos, pessoas que abraçaram o Evangelho com intensidade e graça na
vida cotidiana, deram-se sem reservas para cumprirem o projeto de Deus em si e
no mundo, sabendo seguramente que nada tem sentido ou traz felicidade fora de
Deus. Como não recordar Santa Inês, São Domingos Sávio, São Francisco e Santa Clara
de Assis, São Tarcísio, São Luiz Gonzaga, Santa Maria Goretti, Santa Teresinha
do Menino Jesus, a mártir brasileira Beata Albertina Berkenbrock, Beato José de
Anchieta, dentre tantos e tantos outros que tornaram suas vidas uma bandeira
reflexiva da santidade de Cristo, cada qual em sua época e em seu contexto
cultural e geográfico.
Que
Jesus Cristo ‘Caminho, Verdade e Vida’ (cf. Jo 14,6) seja a novidade perene
para os nossos jovens. Que, experimentando-O, eles possam ‘curti-Lo e
compartilhá-Lo’ (utilizando, desta forma, dois verbos que estão bastante em
voga no Facebook) pela sua descoberta nos Evangelhos, na Eucaristia, na
solidariedade e na caridade. E, assim trilhando, construam, pela
disponibilidade aos planos divinos, neste mundo, a ‘civilização do amor’, que é
o próprio Deus.
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