SOMOS SAL, LUZ, FERMENTO...

Ao fazer uso neste espaço para uma breve palavra acerca do processo eleitoral que se nos avizinha no outubro próximo vindouro, tenho presente o meu dever de, como Bispo, ser primordial catequista para o Povo de Deus, que, tal como na sociedade brasileira, tem um grande poder de, com o seu voto, transformar a realidade de seu país, caso faça uma opção acertada na urna.
Aristóteles afirmava com veemência que a Política é a ciência que tem por objetivo concorrer, em consonância com a Ética, para felicidade humana, e para tanto deve primar pelo bem-comum, excedendo a um mero benefício subjetivo. Assim, “vemos que toda cidade é uma espécie de comunidade, e toda ela se forma com vistas aalgum bem [comum], pois todas as ações de todos os homens são praticadas com vistas ao que lhe parece um bem; se todas as comunidades visam a isso, é evidente que a mais importante de todas elas e que inclui todas as outras tem mais que todas este objetivo e visa ao mais importante de todos os bens; ela se chama cidade e é a comunidade política” (Política, 1252a).
Por que trago a lume este pensamento aristotélico? No afã de responder, não somente à questão ‘em quem e por que votar’ de maneira unicamente teórica, mas que envolva e preencha, pela prática, a vida do cristão, que civilmente é cidadão, fazendo-o refletir sobre um direito do qual é dotado, que, se usado com a justiça e a seriedade cabíveis, torna-se uma arma potente para a transformação de realidades em sua volta.
Percebam: a Política está para o bem-comum. Logo, seja esta sentença o critério inequívoco e primeiro para o nosso ato de escolha de nomes para o poder público, tal como deve se caracterizar as eleições num Estado Democrático de Direito. Com esta advertência, podemos clarificar alguns pontos:
·      Visando o bem-comum, o que embute em si, como princípio radical, o meu bem particularmente subjetivo, não devo votar em quem me garanta alguma ‘segurança’ ou ‘benefício’ espúrios unicamente a mim ou aos meus familiares, ou mesmo aos que me são afins.
·      O voto é um direito inegociável do qual não podemos abrir mão. Se, ainda que de maneira sorrateira, analisarmos a história democrática do Brasil, perceberemos a evolução do voto, inclusive da abrangência daqueles a quem era permitido o ato de votar. Numa seletiva, nem todos podiam fazê-lo. Hoje, não. O sufrágio universal (sob duras penas, conquistado) garante que o povo escolha pessoas que representem os seus anseios, que falem por si.
·      A Democracia, como poder emanado do povo, é um exercício que exige uma responsabilidade consciente, que exclua o voto por qualquer tipo de sentimentalismos que redundem em ‘paixões’ ou no automatismo de ‘tradições’ ou em coações de qualquer sorte.
·      A Política – encarada na seriedade de ações, que admitem também cobranças – épapel do cristão, porque nela também deve ser refletida o critério da caridade que Cristo nos exigiu para com o nosso próximo. Assim se expressou o Papa Francisco em uma de suas audiências-gerais: “Para os cristãos, é uma obrigação envolver-se na política. Nós, cristãos, não podemos fazer como Pilatos: lavar as mãos. Não podemos! Devemos nos envolver na política, pois ela é uma das mais altas formas da caridade, porque busca o bem comum. E os cristãos leigos devem trabalhar na política. Você, então, me dirá: ‘Mas não é fácil, pois a política está muito suja’. E, então, eu pergunto: A política está suja por quê? Não será por que os cristãos que se envolveram na política sem o espírito do Evangelho? Faço-lhe outra pergunta: É fácil dizer que a culpa é de outro, mas eu o que estou fazendo? É um dever trabalhar para o bem comum, é um dever do cristão!” (Audiência-Geral de 07 de junho de 2013).

Faço sinceros votos de que, também no mundo da Política, ainda que seja no aparente anonimato do seu voto, o cristão faça valer o que nos advertiu, em total atualidade, Jesus Cristo acerca de nossa presença e ação no mundo: “Vós sois o sal da terra... Vós sois a luz do mundo... Vós sois o fermento na massa...” (Mt 5,13.14; Lc 13,21).
(DOM DULCÊNIO FONTES DE MATOS - BISPO DIOCESANO)

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